Matriz Buenos Aires

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sexta-feira, 7 de março de 2014

Há um milagre... (parte I)

                Há um milagre todo especial. O retorno da morte à vida ganha o nome de ressurreição e o entendemos como fato milagroso. Obviamente a morte a que estamos nos referindo é a morte do corpo, os sinais vitais se vão, a respiração sessa e se apresenta um quadro irreversível dos sentidos fisiológicos humanos. Mas e quando morremos por dentro? Quando é a nossa alma que está morta, e não o nosso corpo, isto é menos morte? Algumas vezes questionei a meus alunos e a diversos públicos que tive o prazer de conviver, qual seria a dor mais forte, a da alma ou a do corpo, e jamais obtive qualquer resposta contrária a esta: a da alma. Ora, se a dor mais contundente é a da alma, por que então não seria morte o falecimento da alma? Bem, não entrarei no mérito da questão científica, mas sei que cada pessoa que me ler agora e que já passou por uma tristeza profunda ou que conheceu males da alma, como a depressão, por exemplo, irá entender muito bem a que estou me referindo, pois perder qualquer razão de existir e direcionar sua vida para o nada é de fato morrer sem jamais deixar de respirar. Toda e qualquer chance de se sair desta situação é recebida não menos como uma ressurreição. E não seria?

                Olhar os olhos humanos negros e sem brilho é de fato olhar a morte. Pessoas que passam a vida mendigando atenção e afeto, mas que de fato aspiram o amor, se subjugando e se jogando no lixo, permitindo toda e qualquer condição para receber alguma sobrevida a seu vazio mais profundo. Perder a luz do sorriso, ele não vem mais aos lábios e quando parece estar lá, realmente é apenas o disfarce para receber uma miserável moeda de atenção, ou simplesmente o desejo se sentir vivo. Vivo? Quando se passa a ser pelo que outros pensam ou acham, vende-se a dignidade para receber um afago ou a ilusão do cuidado, sendo de fato a troca pelo gozo fugaz que nos lança no terreno das ilusões e devaneios. Criamos um mundo de fantasias e quando nos deparamos com a realidade, já não estamos mais em nós mesmos, já não vivemos uma vida, somos o personagem, objeto de diversão, para aqueles que acreditávamos nos querer bem, descobrindo que somos, na realidade, um bem na prateleira de seus objetos de uso pessoal. E não adianta culpá-los por isto, pois somos nós mesmos que damos a infeliz permissão para que façam de nós aquilo que querem, quando querem e como querem. Perdemos qualquer senso de sobrevivência, não é isto uma forma de vender a alma? Vazio, solidão, tristeza... Desesperança. O corpo, ainda que respirando, recebe as consequências disto tudo, são chamadas de doenças psicossomáticas, parece um comando ao corpo de que a vida já não é tão bem vinda. Se a alma indica sua morte, estaria dizendo ao corpo que ele não tem mais valor? Ou, a alma, em doença grave, indica ao corpo sua debilidade? Parece-me que os fatos caminham nesta direção, no entanto, somos impedidos de uma conclusão mais cartesiana. Porém, não temo em errar, pois no momento em que chegamos a este nível, conclui-se uma morte interior que pede por uma ressurreição, ares que inflem os pulmões da alma, sangue novo ao coração da existência. Não estamos falando de um milagre? O milagre que retorna a vida total do ser, pois não é a alma maior que o corpo? Então posso dizer que tenho passado a vida vendo grandes e maravilhosos milagres. A beleza retomar o rosto desfigurado pela máscara das ilusões.

2 comentários:

  1. Nós, a que o Senhor decidiu ressuscitar a alma, entendemos bem de suas dores... e de quão baixo o ser humano pode descer para mitigar essa dor e adiar ou disfarçar essa morte da alma por que não lembra de olhar para o rosto do Amor...

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  2. Quando se toma consciência de quão baixo se chegou em busca dessa tal "vivacidade", o primeiro sentimento é raiva por todos que contribuíram para o falecimento da alma. Depois vem o rancor de si próprio por ter se entregado a ilusão e a esses devaneios.
    Remédios, terapias e etc, dão a falsa ilusão de que a alma está ressuscitando, porém, no silêncio da noite, sente-se o vazio. No íntimo de si mesmo, vem a certeza de que a alma permanecerá morta.
    Ainda bem que conhecemos a Solução, o único Ressuscitador de almas o qual nos estendeu a mão e ofereceu seu perfeito amor.

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